O produtor cultural Fernando Zelman é, junto com Danilo Blanco, idealizador do Circuito de Moda e Arte, um dos principais eventos que, a partir de palestras, mostras de cinema e debates, evidencia a democratização e descentralização do acesso à cultura de moda.
Aproveitei a deixa que tive ao realizar a matéria “Vestindo Cultura – Onde encontrar eventos culturais de moda na cidade de São Paulo?” para a Revista Arruaça da Faculdade Cásper Líbero e entrevistei Zelman a fim de que ele pudesse expor suas ideias sobre a cultura de moda e a introdução desta na cena artística paulistana.
Confiram a mini-entrevista e a visão do idealizador desta ação de grande impacto, repercussão e excelência para este viés da moda.
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1. Na moda há uma tendência forte em motivar a exclusividade – desfiles, eventos e lançamentos em geral não são abertos ao grande público. No Circuito de Moda e Arte as palestras são livres e gratuitas. O objetivo desta democratização era o de quebrar com este paradigma?
Sim, nossa proposta é democratizar e descentralizar o acesso à cultura de moda, razão de primarmos pela gratuidade em todas as ações do Circuito, assim como estimulamos que todas as ações tenham uma linguagem acessível, que possa beneficiar tanto os leigos como os entendidos em moda.
É claro que existem eventos fechados direcionados a públicos específicos, mas nossa ação junto ao circuito de Moda e Arte pretende alcançar o maior numero de pessoas, sem nenhum tipo de exclusão.
2. Aqui no Brasil o público médio entende o cinema, o teatro, a música e as artes como atividades culturais. Você acredita que a moda também é vista sob sua vertente cultural e comportamental ou ainda há o falso conceito de que “moda” é apenas um sinônimo para “roupa”?
Há alguns anos, quando começamos a promover exposições e mostras de moda, ou de artes visuais com a participação de estilistas, o questionamento se moda faz parte de nossa cultura era continuo e vindo de instituições que não poderiam ter este tipo de postura. Acreditamos que esta mentalidade mudou no Brasil de uns 4, 5 anos, mas ainda existe muita resistência no reconhecimento da moda enquanto genuína expressão cultural Brasileira.
Fomos pioneiros em muitos aspectos, como obter incentivos de projetos pelo Ministério da Cultura, ainda na época que a moda não era reconhecida pela pasta e ainda apresentar propostas em espaços que ainda não tinham recebido ações de moda, como é o caso da Pinacoteca do Estado, Centro Cultural Banco do Brasil e Museu da Língua Portuguesa.
Atualmente existem diversos projetos que contribuem para o reconhecimento da cultura de moda, um dos exemplos é a publicação “Moda Brasileira” da Editora Cosac Naify que registra e reconhece a atuação dos principais nomes de nossa moda, sem contar as belíssimas exposições e mostras promovidas no Shopping Iguatemi de São Paulo e no Museu de Arte Brasileira da FAAP, mas somente com apoio do Ministério da Cultura para a valorização e difusão da cultura de moda é que pôs fim a discussão se moda é ou não é cultura.
3. É perceptível a visibilidade que o Circuito de Moda e Arte tem na imprensa especializada. Mas, como vocês lidam com a grande mídia? Há nela uma consciência de divulgação da cultura de moda brasileira?
A grande mídia sempre foi generosa com as edições do Circuito, abrangendo as principais emissoras de rádio e TV e revistas e jornais de grande circulação em todo o Brasil.
É natural que exista também um corporativismo na imprensa quando o assunto é moda, afinal, existem anunciantes com cifras milionárias, mas acreditamos que este lobby não chega a atrapalhar a divulgação de nossa moda. Neste anos, percebemos que as pessoas que tem um trabalho interessante, a imprensa e isso inclui a grande mídia, divulga espontaneamente as novas criações e ideias.
Vejo com bons olhos a vinculação de estilistas reais em novelas da TV Globo, como também, algumas tramas que tem a moda como foco. É natural que a moda seja ainda vinculada de maneira muito folclórica e estilizada, mas vale destacar que nossa cultura de moda, já foi noticiada com muito mais vigor. Neste sentido, sempre cito o estilista Dener Pamplona de Abreu, que em seu auge, numa simples aparição num programa de TV, aumentava consideravelmente a audiência, assim como o estilista Clodovil que estrelou o lançamento do automóvel Monza da Chevrolet, comprovando o poder que estes dois estilistas exerciam junto à imprensa.
Agora, a consciência em divulgar a cultura de moda brasileira pela grande mídia está bem maior do que era, e acreditamos que o fato de muitos jornalistas estarem se especializando em moda, contribua para este crescimento, pois o Brasil, já possui um bom mercado de moda, que abrange o ensino e a formação. Resta agora a imprensa trabalhar na democratização de ideias de moda que estimulem um consumo mais atento, antenado aos movimentos culturais, sociais e ambientais e sobretudo, que possamos em breve ter consumidores mais poéticos, que namorem suas roupas, que as compre pelo tato, pelo cheiro, pelo coração…
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♦ Leia também: Matéria “Vestindo Cultura – Onde encontrar eventos culturais de moda na cidade de São Paulo?” para a Revista Arruaça da Faculdade Cásper Líbero.
♦ Não poderia deixar de agradecer imensamente Fernando Zelman, que foi muito atencioso e generoso comigo para que a matéria saísse do jeito que eu esperava. Muito obrigada!