Eu te esqueci. E é assim em todos os finais dos dias. Convincente. Já nem lembro a voz ou o nome. Inventei, contei. Esqueci.
Uma dosagem por embalagem e sem remédio pra memória. Uma carta por jogo e sem palavras cruzadas. Uma nota por recado. Sem lembranças. Esqueci.
Aos poucos. Gradativamente. Um episódio por vez. Uma cena por capítulo. Uma série em uma dúzia de meses. E assim sigo a temporada.
Assim, porque era a coisa certa a se fazer e eu já tinha adicionado a dupla de palavras “te esquecer” na minha lista de compromissos. Você sabe o quanto sou organizada.
Um erro por gole e um gole por bebida. Um segundo por momento e sessenta por minuto. Um gosto por beijo e em cada um o flashback. E eu evito voltar no tempo. No nosso tempo que – sério – eu esqueci.
Como uma das promessas de Ano Novo. Puladas as setes ondas e eu ainda me vejo perdida. Mas que fique claro: eu esqueci! Um eco por grito e uma lágrima por desespero.
E foi assim, devagarinho. Lentamente. Colocando outro no seu lugar. Dois ou três. Talvez. Ajuda pouco mas vou indo e te esquecendo um passo por centímetro e um metro por quilômetro.
Foi com pressa, mas demorou tanto! Porque o tal do tempo quis assim e com ele eu não ouso discutir. Manipuladamente. Eu esqueci os motivos pelos quais eu precisava desesperadamente te esquecer de vez. E eu o fiz.
Um sentido pelos cinco. O tato pelos abraços e o teu cheiro de roupa limpa pelo olfato. Os olhares entorpecentes pela visão e dos sussurros envolventes a audição. E o paladar ainda aguçado quando se trata de todos os teus gostos que deixam minha boca pedindo por mais. O sexto ainda fica aqui. O sentido. Mas eu já esqueci.
Esqueci de ti e de mim. Buscando o meu eu de um ano e alguns meses atrás. Meu eu imune momentaneamente ao amor. “O silêncio é a melhor resposta” – você costumava dizer. Mas dizendo pude ouvir todas as vogais e consoantes, ditongo e hiatos. Nosso hiato. Um turbilhão na calmaria. Um alívio para quem tinha se afogado. Eu tinha e me esqueci.
E eu minto que foi fácil e que pouco chorei. Jorrei palavras de felicidade – “Espero que seja feliz!”. Muito. E sumi. De uma vez. Uma frase por impulso e um rio por solidão. E eu realmente espero.
Um sentimento por vez. Já saíram pela porta principal o rancor e o desespero. O amor quis sair – envergonhado e cabisbaixo – pelas portas do fundo; e sabe, eu permiti. Ou quase isso. É que, se alguém me perguntar, eu demonstro indiferença – afinal, esse é o meu álibi. E todos os dias eu vou convencendo, uma silaba por palavra e uma palavra por sensatez, que te esqueci.
(Autora: Mainá Belli)
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