Eu, você e o gostinho de alcaçuz em meio ao deserto. Nós dois. Os teus cigarros e a minha sobremesa. O teu soluço seguido de um susto. O pouco de lágrima que restou.
Na sua escrivaninha, na gaveta à esquerda. Abra você mesmo e verá. Estão lá.
Me entende? O que era nosso ficou. Ficaram as rugas dos risos e a bagunça no lençol. Ficou a marca do meu batom cor de tomate e a mancha de vinho no tapete indiano que fica no corredor.
Ficam mais que os discos velhos da Janis Joplin e a vitrola que não pode mais tocar. Mais que o teu sotaque cantado e o teu sobrenome ao meu colado. Mais que o gosto seco que em minha boca agora impregnou.
Ficaram os gritos sufocados e o suor exalado. Os segredos cuspidos e nenhum desejo reprimido.
Abra agora a gaveta à direita.
Ficaram os beijos, os tapas e as mordidas. Arranhões, chupões e puxadas de orelha. Sobraram as brigas e as pazes feitas. O que é nosso sempre fica. Em cima da mureta.
Ficam.
É tudo mesmo que me lembra você? Ou são as gavetas estreitas em demasiado e um tanto quanto pequenas?
Mas eu sei.
Ficaram meias palavras, silêncios inteiros e gemidos à dois. Junte tudo o que restou e guarde-os novamente. Com cautela. Sem pudor, por favor. É que, de todas as coisas que sobraram, eu só precisava de quem não ficou.
Comente com o Facebook